"Chovia, chovia, chovia e eu ia indo por dentro da chuva ao encontro dele, sem guarda-chuva nem nada, eu sempre perdia todos pelos bares, só uma garrafa de conhaque barato apertada contra o peito, parece falso dito desse jeito, mas bem assim eu ia no meio da chuva, uma garrafa de conhaque e um maço de cigarros molhados no bolso. Teve uma hora que eu podia ter tomado um taxi, mas nao era muito longe, e se eu tomasse o taxi nao poderia comprar cigarros nem conhaque, e eu pensei com força que seria melhor chegar molhado, porque beberiamos o conhaque, faz frio, nem tanto frio, mais umidade que entrava pelo pano das roupas, pela sola fina dos sapatos, e fumaríamos beberíamos sem medidas, haveria discos, sempre aquelas vozes roucas, aquelee sax.....Tão geladas as pernas e os braços que pensei em abrir a garrafa para beber um gole, mas nao queria chegar meio bebado na casa dele, halito ardido, eu nao queria que ele pensasse que eu andava bebendo, e eu andava, todo dia um bom pretexto, e fui pensando tambem que ele ia pensar que eu andava sem dinheiro, chegando sem taxi naquela chuva toda, e eu andava, estomago dolorido, e eu nao queria que ele pensasse que eu andava insone, e eu andava, roxas olheiras, teria que ter cuidado com o labio inferior ao sorrir, para que ele nao visse meu dente quebrado e pensasse que eu andava relaxando, sem ir ao dentista, e eu andava, e tudo que eu andava eu nao queria que ele visse nem soubesse, mas depois de pensar isso me deu um desgosto porque fui percebendo, por dentro da chuva, que talvez eu nao quisesse que ele soubesse que eu era eu, e eu era."
CaiO F. Abreu
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