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Era tarde, não da noite, da tarde. E embora o calor queimasse a pele, não era verão. Era algo próximo à primavera, ou então a qualquer uma das outras três estações do ano. Era também um tempo desses em que o tempo se modifica a todo instante. Até as chuvas que antes eram ditas de março, agora faziam parte do agitado calendário de setembro nesse tempo. E era, ou é, esse o meu melhor jeito de começar uma história, essa história, dizendo assim quase que len-ta-men-te que naquela tarde de quinta o suor molhava as calçadas, mas por dentro a saudade de sempre permanecia intacta.
Eles se conheciam há muito tempo. Embora o contato próximo existisse há apenas uma, duas, três semanas talvez... Sempre se entreolhavam ao se cruzarem vadios pelos corredores, ruas, shoppings, parques e por todos os espaços daquela cidade suja. E talvez por medo de um, solidão exagerada do outro, ou quem sabe caso antigo, ou qualquer coisa assim, só agora, a poucas semanas o “grande encontro” aconteceria. E com ele mudariam as cores, os sabores de boca provada, o perfume do dia seguinte... as esperanças. Aquele era o momento mais exato para uma possível aproximação, e quem dirá um possível começo de história. Que ao contrario dessa história, não começaria com – Era tarde.
O que ficará do encontro era vivido e mantido diariamente pelos inúmeros pensamentos que mantinham um pelo outro. As mensagens trocadas, os telefonemas. As formas delicadas de mostrarem interesses mútuos e crescentes.
Naquela tarde o calor só fazia aumentar a saudade e a falta e a esperança de acreditar em tudo... A cada novo instante a pele se transformava em água, e sal, suor. Neles só iam ficando o começo de sentimento bom e as lembranças daquele encontro. Todo o resto seria transformado em líquido, derretido, vapor humano. E bem provável que se virassem mesmo nuvem e depois chuvas, completando aquele velho esquema do ciclo da água, virariam chuva de bolinhas azuis. De um azul daquele que o céu se veste exatamente as seis horas da tarde, enquanto a cidade se agita em gritos pela caída da noite. Delicadamente, uma chuva de bolinhas (talvez de ping -ong?) azuis.
O maior deles, - porque era assim, meu pequeno, que ele docemente tratava o outro - caminhava pelas ruas enquanto se derretia leve, gota por gota. O outro – pequeno – tentava evitar o suor com ar fabricado enquanto se ocupava de tarefas remuneradas e às vezes estressantes. Assim se passavam os segundos, as horas. E a cada corrida nova do relógio, o pensamento mútuo crescia, ambos pensavam um no outro quase que compulsivamente.
Foi ai então que por um instante um deles fechou os olhos e disse como quem se desaguava em loucura e medo da solidão
– Eu te quero muito bem, nesse exato momento. Eu te quero muito bem!
E como uma espécie de mágica, ou premonição, ou qualquer que seja dessas ligações astrais, o outro pode ouvir e sentir bem o que o outro dizia. Mesmo distantes. Estavam ligados.
Desejaram juntos se derreter em suor, antecipar encontros. Virar chuvas sem estações definidas, mares gigantescos. Juntos. Evaporar..
Maycol C.
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